Com a Covid-19, o modo de vivermos mudou, passamos a transitar menos, a usar máscaras, a ter mais preocupação com a higiene e com a limpeza de modo geral. A pandemia trouxe consigo exigências, a mídia estourou com crises econômicas e do Sistema Único de Saúde (SUS). O "Fique em casa" se instalou. Como ficar em casa se as nossas singularidades não nos permitem? Como não passar fome? Tantos sem emprego... E as crises depressivas, ansiosos trancados, evitando visitas e exposições ao "tal" vírus?! Ser eficiente, proativo e preservado se tornou um desafio não só pessoal, mas sim social.
Em momentos de crise, nosso corpo e nossa mente ficam em alerta dando vazão à ansiedade e a fragilidades que tentamos ignorar no nosso cotidiano. A falta de contato físico faz com que fiquemos nervosos e angustiados, angústias essas que "batem em nossa porta" quando informam no noticiário a quantidade de casos positivos e mortes diárias. Parece que tudo está mal e mal chegamos no auge da pandemia.
Com a pandemia, as pessoas que antes eram vulnerabilizadas (moradores de rua, mulheres, crianças abusadas e espancadas, pessoas em situação de rua, trabalhadores informais, etc...) tornam-se ainda mais vulneráveis. Nossas deficiências, fraquezas, subjetividades e esquecimento do governo tornam-se maiores como se fossem monstros que vivem em nossa sombra aguardando o momento certo para aparecerem (ou o momento em que estamos a sós) e nos deixarem mais fracos e inseguros.
Ficar sozinho é a palavra-chave para a recuperação da saúde mundial, mas e aqueles que já são sozinhos? Ficam mais solitários ou são subalternizados pelo governo?!
A hipocrisia sobreposta pela frase "Fique em casa" serve somente para aqueles que possuem casa, pois, em uma pirâmide social, as pessoas mais agredidas são aquelas que fazem parte da base dela, essas pessoas possuem como característica em comum a pele negra, o corpo transgênero e morada na rua. Os mesmos possuem trabalhos invisibilizados, não têm direitos trabalhistas, são evidenciados a agressões diárias e, constantemente, vêem-se expostos a explorações físicas e mentais.
O que nos resta, em momentos de crise, é prestarmos atenção às nossas fraquezas, deixarmos de lado o individualismo e pensarmos em nós mesmos e nos outros como agentes transformadores e fortalecedores do meio social. Meditarmos, escrevermos e nos autoconhecermos são medidas que se encaixam como a chave para diminuirmos as aflições da nossa solitária estadia em casa. Para alguns, a quarentena serve como "renovação espiritual", mas para muitos ela é sinônimo de tentativas suicidas, depressão, aflição, disforias e solitude.
A quarentena pede empatia e sensibilidade, a nós mesmos e ao próximo.
Hevi Aqualtune
(Ex) Jovem Aprendiz do Programa Nossa Travessia da Pontos Diversos